segunda-feira, 7 de junho de 2010

A Enfiada de Petas

Era uma vez um homem que não pôde pagar a renda ao fidalgo de que era caseiro. Assim, decidiu-se a pedir, que lhe fosse perdoada a dívida. Porém, o fidalgo pensou que o outro lhe estivesse a mentir.
-Só te perdoo as medidas de renda se me disseres uma mentira do tamanho de hoje e de amanhã.
Foi-se embora o lavrador para casa e contou o que se passava à mulher.
E que não fazia ideia de como contentar o senhorio, que bem os podia pôr na rua. Um filho meio toloque o rendeiro tinha, ouvindo os medos do pai disse:
-Ó meu pai, deixe-me ir ter com o fidalgo,que eu hei-de arranjar a coisa de modo a que ele não tenha remédio senão perdoar-lhe a renda.
-Mas tu não atas coisa com coisa...
-Por isso mesmo.
Foi o meio tolo ter com o fidalgo dizendo que estava ali para pagar a renda. O fidalgo mandou-o entrar e ele então disse:
-Saberá vossa senhoria que a colheita foi má, mas isso não tem importância. O meu pai tinha tantos cortiços de abelhas que não lhe dava conta. Pôs-se a contar as abelhas e deu que lhe faltava uma. Botou o machado às costas e foi procurar a abelha. Achou-a pousada no cimo de um amieiro. Vai ele, cortou o amieiro para caçar a abelha, que por sinal vinha tão carregadinha de mel que ele crestou-a e, não tendo em que guardar o mel, meteu a mão ao seio e tirou dois piolhos. Da pele destes fez dois odres que encheu. Mas quando ia para entrar em casa, uma galinha comeu-lhe a abelha. Atirou um machado à galinha para a matar mas o machado perdeu-se entre as penas e só depois que elas arderam é que achou o olho do machado. Dali, correu o ao ferreiro para lho arranjare o ferreiro fez-lhe um anzol, com que foi ao rio apanhar peixes. Pescou uma albarda. Tornou a deitar o anzol e apanho um burro morto de há três dias, o qual ainda pestanejava. Pôs-se a cavalo nele e foi ao ferrador para lhe dar uma mezinha, e ele deu-lhe foi um remédio de sumo de fava seca, mas nisto caiu-lhe um bocado num ouvido, onde lhe nasceu tamanho faval, que tem dado favas e comido favas, que ainda aí trago quinze carros para pagar a renda a vossa senhoria.
O filalgo já farto de tanta pratanha, disse:
-Ó rapaz, tu mentes com quantos dentes tens na boca!
-Pois bem, senhor, então está a nossa renda paga.



Adolfo Simões Müller
«O príncipe imaginário e outros contos tradicionais portugueses»
Distri

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